domingo, 4 de março de 2012

JUNTOS ATÉ AO FIM

Crónica publicada no Jornal Público de 02.03.2012 * Autoria de: Luís Francisco (jornalista)
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Oito pessoas unidas por uma corda. Quantas vezes, ao longo do percurso, cada uma delas faria algo diferente, se não estivesse irremediavelmente dependente do que faz quem vai à sua frente e atrás. E, no entanto, é assim mesmo que faz sentido, um organismo colectivo em movimento, devagar, às vezes aos tropeções, de vez em quando refazendo os próprios passos para encontrar o melhor caminho.

Passando palavra. É preciso comunicar linha abaixo as instruções que vêm do topo, fazê-lo de forma clara e concisa. Para quem vai num dos extremos, é quase impossível ouvir o que diz quem está na outra ponta, mas já o sabemos: nunca podemos falar com toda a gente, mas o que dizemos pode chegar a todo o lado. De tempos a tempos, juntamo-nos e trocamos impressões. Mas nem todas as ocasiões são informais; às vezes é preciso respeitar as hierarquias e escutar as instruções de quem nos guia.

Existe uma subordinação, sim. Há sempre alguém responsável por escolher e abrir caminho, alguém que todos temos de seguir, um líder que escolhemos porque sabemos que é o melhor de todos. Podemos procurar consensos, discutir cenários, mas há sempre alguém a quem cabe a decisão final. A corda tem de o seguir. Separar-se não é uma opção. Ficar para trás não é uma opção. Escolher um caminho diferente não é uma opção. Depois de estarmos amarrados à corda, nunca mais somos só nós.

Dependemos uns dos outros. Todos progredimos à velocidade do mais lento. Fazemo-lo porque escolhemos assim. As decisões tomam-se no princípio e no fim; a meio da viagem não há espaço para dúvidas. O mais lento não é o que temos de arrastar; é o que temos de ajudar. Estamos aqui para o ajudar. E sabemos que ele, ou qualquer outro, fará o mesmo por nós.

A manhã está linda, sol, nada de vento. Nem sempre é assim tão fácil. Mesmo quando temos de superar rampas difíceis, é bom sabermos apreciar o que de bom a vida nos atira. Estamos todos a caminho, procurando o objectivo que nos propusemos, apreciando a companhia e as vistas, sofrendo com as dificuldades em encontrar bons pontos de apoio, reservando, cada um para si, as sensações que havemos depois de partilhar.

A corda estica-se e temos de esperar pelo que vai atrás, mesmo se o da frente decide avançar mais depressa. Cada um, à medida das suas possibilidades, tenta compensar estas diferenças de ritmo, a corda passa-nos por uma mão e podemos garantir ali um metro, um instante, de flexibilidade, de compreensão, de entreajuda. Não queremos travar o da frente, mas não podemos arrastar o de trás. Se for preciso, falamos, acertamos o passo. Sabemos que é assim. Ninguém leva a mal.

O sol está já ali, para lá de um último obstáculo. Olhamos para trás e o caminho que fizemos dá-nos forças para continuar. Falta pouco. Só mais uns passos. Foram-se as dúvidas e a dor, agora sabemos que vamos conseguir. Já não somos quem éramos ao começar. E já estamos a pensar na próxima corda a que nos queremos atar.

Oito pessoas unidas por uma corda. Escalámos a montanha. Chegámos lá acima todos juntos. Não me ocorre melhor metáfora para a vida.
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